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Um novo Código Comercial para o Brasil
O atualmente em vigor, editado em 1850, ainda no tempo do Império, teve suas normas, de tempos em tempos, transpostas para outras leis.
O Brasil está prestes a receber novos e expressivos investimentos. Fomos a última economia a entrar, e a primeira a sair, da segunda mais grave crise do capitalismo. Vamos abrigar, quase simultaneamente, os dois mais importantes eventos esportivos do mundo - a Copa da Fifa, em 2014, e a Olimpíada no Rio de Janeiro, em 2016. Negócios relacionados à extração de petróleo na camada pré-sal já se instalam e vitalizam importantes setores da economia. Necessitamos continuar reforçando nossa infraestrutura, atraindo, assim, a atenção de investidores do mundo todo.
A má notícia está na questão institucional. Não bastam, para bem acolher os investimentos que se avizinham, as favoráveis condições econômicas que todos identificam. É necessário, também, que a lei discipline, com clareza, direitos e obrigações de investidores e empresários, para que o investimento se submeta a regras seguras, claras, modernas e adequadas.
O Brasil precisa de um novo Código Comercial. O atualmente em vigor, editado em 1850, ainda no tempo do Império, teve suas normas, de tempos em tempos, transpostas para outras leis. Hoje, resume-se a aspectos do comércio marítimo, como fretamentos, arribadas forçadas e contratos de seguros para o mar. Sociedade anônima, falência e os principais títulos de crédito e contratos empresariais estão regidos por leis próprias, enquanto o Código Civil cuida do empresário individual, da sociedade limitada e outros temas.
É necessário um novo Código Comercial fundamentalmente por dois motivos. Em primeiro lugar, para reunir, de modo consistente, num único diploma, a disciplina da matéria, evitando as incertezas e percalços causados pela dispersão legislativa. Mais que isto, porém, a codificação é imprescindível para ampliar a segurança jurídica dos investimentos feitos no país, de brasileiros e de estrangeiros.
Convém salientar que um Código Comercial cuida apenas das relações entre os empresários. Ele não normatiza as obrigações do empresário frente ao Estado e às outras pessoas. A edição de nova codificação comercialista, assim, não irá alterar, em nada, as obrigações que os empresários têm, atualmente, perante trabalhadores, consumidores e o fisco. Não irá reduzir a responsabilidade legal deles pela preservação do meio ambiente ou por abuso do poder econômico. Ao contrário, na medida em que expressar legalmente o princípio da função social da empresa, um dos fundamentos do direito comercial contemporâneo, o novo código irá até mesmo reforçar estas obrigações e responsabilidades.
Destaco que o investimento não deve ser protegido pela lei, em vista apenas dos interesses individuais do investidor. Muito antes disto, a proteção legal deve ter por objetivo o proveito que o investimento traz para toda a sociedade, gerando empregos, atendendo aos consumidores, mobilizando a riqueza local, regional, nacional ou global, auxiliando o desenvolvimento do país. É a função social do investimento empresarial que deve nortear a edição do novo código.
Para mostrar-se competitivo, na árdua e cotidiana luta pelos investidores, o Brasil deve exibir um direito comercial moderno e adequado, apto a disciplinar, com racionalidade e justiça, as complexas relações sociais e econômicas da atualidade.
Não se pode, neste cenário, descartar a hipótese de que a desindustrialização, perversa para toda a economia nacional, possa ter, entre uma de suas causas, a inadequação da legislação de direito comercial vigente no país. Se o investidor não estiver seguro quanto às regras que serão aplicadas ao seu investimento num determinado país, provavelmente voltará os olhos e interesse para outro, sempre à procura de um ambiente regulatório estável e congruente.
Vivemos um momento político altamente propício ao debate sobre a oportunidade de um novo Código Comercial. O Senado Federal, mostrando que o Poder Legislativo tem amplas condições de definir, no interesse da nação, sua própria pauta, aprovou, no fim do ano passado, novos Códigos de Processo Penal e de Processo Civil. São leis que certamente contribuirão para a agilização da Justiça. Mais recentemente, o senador José Sarney instaurou uma comissão de juristas, presidida pelo ministro do STJ Herman Benjamin, destinada a estudar a atualização do Código de Defesa do Consumidor.
No contexto desta ampla e valiosa revisão dos principais fundamentos do sistema jurídico brasileiro, cabe iniciar-se a discussão sobre a necessidade de também incluirmos o Código Comercial neste salutar processo.
Os advogados que atuam na área do direito empresarial têm crescente dificuldade para posicionar seus clientes sobre o provável resultado das causas judiciais envolvendo contratos de distribuição de mercadorias, direitos e deveres dos sócios, financiamentos bancários, títulos de crédito e outros temas afetos à empresa. Esta dificuldade, que se traduz evidentemente em insegurança jurídica, decorre da inadequação da lei vigente. Para se ter uma ideia desta inadequação, basta constatar que, na parte do Código Civil que cuida do direito de empresa, a palavra investimento simplesmente não é mencionada nenhuma vez. É óbvio, assim, que a nossa lei não está aparelhada para disciplinar satisfatoriamente os investimentos que o Brasil está prestes a receber.
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